Livro de Simone de Beauvoir
A autora narra a angústia que envolveu a internação de sua mãe para tratar de uma fratura do fêmur, decorrente de uma queda, e a morte dela por câncer, descrevendo os absurdos da existência e fazendo valer a tarefa por excelência da literatura: superar a solidão.
Reflexões não muito suaves
Não temo a morte. Ela pode vir hoje, amanhã ou daqui a anos. Tanto faz. O que assusta não é a morte, mas seus métodos, muitas vezes lentos e cruéis. Se o martírio físico e psicológico for grande, faz sentido a vítima desejar partir antes do suspiro final, sem apego a esta terra penosa.
Concordem ou não com o juízo acima, ele é lógico, ao contrário da forma de pensar cultuada pela maioria das pessoas, sempre desejosas por mais tempo no planeta, custe o que custar. Vejamos... 95% dos seres humanos acreditam em um deus; e a maior parte deles concebe um mundo extramaterial de maravilhas: após a morte do corpo, a alma seria levada a um lugar paradisíaco, reencontraria pessoas queridas e seria feliz para sempre. Mas se a vida celestial é infinitamente melhor que a mais dadivosa das vidas terrenas, por que o desejo de permanecer na Terra mesmo quando a existência tornou-se um fardo insuportável? Pois é... Se não faz sentido o apego à vida material quando tudo vai bem, muito menos sentido faz quando tudo vai mal. Como o apego existe, conclui-se: ou as pessoas não acreditam nas maravilhas do além-túmulo, ou elas são incoerentes.
O que falo é de desejo, de querer ficar aqui por puro apego à matéria. Isso exclui as pessoas que entendem sua permanência na Terra como uma missão a ser cumprida. Uma coisa é sentir urgência de continuar no planeta porque isso seria necessário ao aprendizado e ao desenvolvimento do espírito; outra coisa é desejar o adiamento da partida para o paraíso celeste apenas para curtir – mesmo cheio de dores e aflições – mais um pouco os prazeres menores daqui: viagens, festas... Se o “Céu” é tão melhor, qual a razão desse apego, ainda mais em uma situação de dor?